Terça-feira, 17 de Junho de 2008
[…] A dada altura, Sender (1) escandaliza-se com o horário de trabalho dos operários de 1873: 60 horas semanais. Justa revolta: desde 1917, vigorava a obrigatoriedade das 48 horas. Acontece, agora, os ministros do emprego e assuntos sociais da UE aprovarem que se possa alargar o horário a 65 horas (12 diárias) e que o empregador negocie, directamente, com o empregado. Que diria Sender deste brutal retrocesso?
Manuel Poppe, Jornal de Notícias
[15.06.2008]
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(1) Ramón J. Sender [1901-1982], escritor espanhol [de Huesca, Aragão], combateu pelos Republicanos, contra os Nacionalistas de Franco, na Guerra Civil Espanhola.
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1. Agora sou eu quem pergunta: O que vamos dizer nós?
Todos os dias somos confrontados com o roubo descarado dos direitos que os trabalhadores que nos antecederam conquistaram. Numa luta que durou séculos e que lhes custou, muitas vezes a liberdade e, algumas, a vida. Nada foi dado pelos donos do poder e do dinheiro; tudo foi arrancado pela força de quem acreditou ser possível viver com dignidade num mundo mais justo.
Graças a eles, criou-se o chamado modelo social europeu, destinado a proteger os cidadãos nos momentos mais críticos das suas vidas (desemprego, doença, velhice, etc.) e a elevar o seu nível (e qualidade) de vida, nomeadamente no que respeita às condições de trabalho.
Nasci na Europa. Nasci num continente que “ia à frente” na defesa dos valores democráticos e humanistas; que se considera civilizado. Um continente que, apesar das suas contradições e fragilidades, se empenhava na construção dum mundo mais justo e igual.
Que é feito dessa Europa? Vêmo-la fechar os olhos aos desvarios americanos que mascaram a sua avidez insaciável, semeando democracias (?) à força. Vêmo-la a aumentar o horário de trabalho, transformando os homens em máquinas produtivas sem tempo para serem Homens. Porquê e para quê?
É certo que as economias emergentes, como a China e a Índia, que crescem à custa de trabalho escravo, se tornaram concorrentes da economia europeia. Mas o caminho não é, NÃO PODE SER, reduzir ou eliminar os direitos conquistados pelos trabalhadores europeus. O caminho tem de ser o da Europa se assumir como exemplo, demonstrando que o desenvolvimento económico pode não ter como paradigma o enriquecimento de alguns à custa da pobreza e da humilhação de muitos. Não são os trabalhadores europeus que têm descer ao nível dos indianos ou chineses; são estes que devem conquistar direitos semelhantes aos dos europeus. Levará o seu tempo, concordo, mas não é impossível e é, não tenho dúvidas, a solução correcta e justa.
Talvez os grandes empresários e investidores tenham de baixar os seus lucros. E depois? Deixarem de ser tubarões, que engolem o seu semelhante, só fará deles seres humanos mais dignos e felizes.
2. A Irlanda votou “não” ao Tratado de Lisboa. Há, por isso, quem aconselhe o Governo irlandês a convencer o povo a mudar de voto, em próximo referendo, e até há quem defenda a sua saída da UE. Que resultados teríamos se nos outros países se tivesse feito referendos? Por que não se fizeram? De que têm medo os Governos europeus?
Que democracia é esta que não permite aos cidadãos decidir o seu futuro? A Europa que está a construir-se é, cada vez mais, uma escolha dos políticos. O que vai acontecer quando os europeus, perante as dificuldades, descobrirem que não são mais senhores do seu destino?
Sexta-feira, 13 de Junho de 2008
O escritor açoriano Daniel de Sá foi agraciado com o grau de Oficial da Ordem Infante D. Henrique, a 10 de Junho, em Angra do Heroísmo. As cerimónias de entrega das condecorações realizaram-se, pela primeira vez em separado nas Regiões Autónomas, num sinal de "reconhecimento e respeito por estas terras e por estas gentes", como explicou o Representante da República, José António Mesquita.
Congratulando-me com este merecido reconhecimento da obra de Daniel de Sá, por parte da República Portuguesa, deixo aqui um dos seus belíssimos textos e um abraço de parabéns.
O TEAR
No tear abandonado, só as aranhas voltaram a tecer. E elas mesmas tinham abandonado também as suas mantas de fios como redes de pescar na praia de um mar sem peixe.
Madalena tecera mantas e fama até muito longe. Na freguesia, era conhecida como a Tecedeira da Serra, longe, era a Tecedeira de Quintais. Não gostava de que a chamassem assim, mas não protestava porque não servia de nada. A fama valia-lhe o proveito de ter as mantas sempre de encomenda, às vezes de lugares de que nem soubera o nome antes. Depois dessa fama, viveu com outra, muito má. Não por razões semelhantes às da santa do Evangelho, porque ela mal tinha tempo para os deveres conjugais e suas consequências regulares. Chegou a trabalhar de lua a lua, que de sol a sol havia a casa para cuidar, o queijo para fazer, os filhos e o marido para alimentar. Tanto mais que o destino lhe pregara uma pirraça. Nem de propósito, enquanto a maior parte dos casais esperava, por vezes em vão, filhos machos para os trabalhos duros da serra e das courelas, ela teve três rapazes antes de que Deus lhe desse uma menina.
Manuel Cordovão lembrava-se vagamente. Andaria ele pelos cinco ou seis anos, passou um ministro em Quintais a levar cumprimentos de Lisboa. Haveria de parar na Aldeia Nova do Vale, para receber os desta aldeia e dos pastores da serra. O presidente da junta quis que fosse oferecido ao senhor ministro o melhor que na sua freguesia era produzido. Não faltaram alguns com excelentes queijos, mas isso era coisas de se comer e esquecer depressa. Uma manta, que aquecesse sua excelência no Inverno e lhe enfeitasse a cama no Estio, seria a recordação ideal de um povo trabalhador e artista, para que ele soubesse até onde Portugal podia contar com a sua gente, se bem que a sua gente, ali, não pudesse contar muito com Portugal. Só era lembrada, e no caso dos homens, para o serviço do rei ou da república, quando chegava o tempo da tropa. Depois de aprenderem a dar uns tiros, os moços eram despejados de novo nos seus aposentos de pedra tosca.
O presidente da junta pediu a Madalena para oferecer uma manta ao senhor ministro. “Como ele vai ficar agradecido ao saber que houve quem pensasse nele! Pode ser até que faça um caminho melhor para a gente andar de uma aldeia a outra. Ou pelo menos um fontanário, se calhar, quem sabe, luz eléctrica…” Madalena ouvira o pedido com espanto, dizia-se. E perguntou: “Quanto ganha o senhor ministro?” O presidente da junta não sabia ao certo, mas arriscou: “Talvez uns três contos por mês.” Ela voltou os olhos para a manta que tinha no tear, e respondeu com ar de desprezo, em vez da admiração talvez esperada por uma quantia tão grande: “Eu não ganho isso num ano!...”
Ficou a amaldiçoada. Patrioticamente amaldiçoada. Fuinha, avarenta. Para provar que o não era, não aceitou encomenda para a manta que haveria de começar a seguir. Ofereceu-a à Maria dos Anjos, que era pobre e ia casar daí a um mês.
A maior parte das suas mantas passou a ser vendida sem origem definida. E não viveu o suficiente para saber que também os cravos podem ser tecidos.
Daniel de Sá, capítulo XXVI da novela
O Pastor das Casas Mortas
Quinta-feira, 12 de Junho de 2008
13 de Junho de 1888, 15.30h, no quarto andar do nº 4 do Largo de S. Carlos, em Lisboa, nasce FERNANDO António Nogueira PESSOA.
Quarta-feira, 11 de Junho de 2008
MAR DE VERÃO
No verão cinzento,
cinzenta era a alegria,
azul a cor
da melancolia.
Quem me prometia o mar,
se dar-mo não podia?
Albano Martins
Terça-feira, 10 de Junho de 2008
Ao desconcerto do Mundo Os bons vi sempre passar No Mundo graves tormentos; E para mais me espantar, Os maus vi sempre nadar Em mar de contentamentos. Cuidando alcançar assim O bem tão mal ordenado, Fui mau, mas fui castigado. Assim que, só para mim, Anda o Mundo concertado.
Luís de Camões |
Estátua de Camões [Constância]
Quarta-feira, 4 de Junho de 2008
Muitos parabéns, Jorge!
Obrigada pelas tuas músicas.
A Gente Vai Continuar
Tira a mão do queixo, não penses mais nisso
O que lá vai já deu o que tinha a dar
Quem ganhou, ganhou e usou-se disso
Quem perdeu há-de ter mais cartas para dar
E enquanto alguns fazem figura
Outros sucumbem à batota
Chega aonde tu quiseres
Mas goza bem a tua rota
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Todos nós pagamos por tudo o que usamos
O sistema é antigo e não poupa ninguém, não
Somos todos escravos do que precisamos
Reduz as necessidades se queres passar bem
Que a dependência é uma besta
Que dá cabo do desejo
E a liberdade é uma maluca
Que sabe quanto vale um beijo
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Domingo, 1 de Junho de 2008
Marta Rietsch Monteiro
Porto, 1 de Junho de 2008