Ia com um único objectivo: obter um lugar com cinco mil rublos de ordenado. Já não se inclinava para nenhum ministério, orientação ou género de actividade em particular. Tudo o que queria era um lugar, um lugar de cinco mil, fosse na administração, nos bancos, nos caminhos-de-ferro, numa das instituições da imperatriz Maria, ou mesmo na alfândega, mas necessariamente sair de um ministério onde não sabiam apreciá-lo.
E eis que esta viagem de Ivan Ilitch foi coroada de um êxito notável e inesperado. Em Kursk entrou na carruagem de primeira classe um conhecido seu, F. S. Ilin, e informou-o acerca de um telegrama recente recebido pelo governador de Kursk, anunciando que por aqueles dias se daria uma mudança no ministério: iam nomear Ivan Semiónovitch para o lugar de Piotr Ivánovitch.
A possível mudança, além da sua importância para a Rússia, tinha uma importância especial para Ivan Ilitch porque, ao promover um novo homem, Piotr Petróvitch, e evidentemente também o seu amigo Zakhar Ivánovitch, lhe era altamente favorável. Zakhar Ivánovitch era colega e amigo de Ivan Ilitch.
Em Moscovo a notícia foi confirmada. E ao chegar a Petersburgo, Ivan Ilitch encontrou-se com Zakhar Ivánovitch e obteve a promessa de um lugar seguro no seu anterior ministério da Justiça.
Uma semana depois, telegrafou à mulher:
"Zakhar lugar Miller. Obterei lugar ao primeiro relatório."
Graças a essa mudança de pessoas Ivan Ilitch obteve inesperadamente, no seu anterior ministério, uma nomeação pela qual ficava dois graus acima dos seus colegas: cinco mil rublos de ordenado e três mil e quinhentos como subsídio de transferência.
Todo o seu enfado com os anteriores inimigos e com o ministério foi esquecido, e Ivan Ilitch sentiu-se completamente feliz.
Voltou para o campo alegre e satisfeito como há muito não se sentia. Praskóvia Fiódorovna também se alegrou e entre eles estabeleceu-se uma trégua. Ivan Ilitch contou como tinha sido felicitado por todos em Petersburgo, como todos os que tinham sido seus inimigos estavam envergonhados e agora o adulavam, como era invejado pela sua posição e, em especial, como toda a gente em Petersburgo tinha gostado muito dele.
LEV TOLSTÓI
Em 1974 foram recolhidas cem mil assinaturas a pedir a legalização do divórcio
Por causa da Concordata de 1940, os casamentos católicos eram indissolúveis
Num cartaz fotografado pelo Diário de Notícias lê-se "algemas no casamento". Outro anuncia que há "dois milhões de filhos ilegítimos". Com a Revolução de Abril de 1974, um vasto movimento popular a exigir a legalização do divórcio pôs-se em marcha. E uma maciça campanha de recolha de assinaturas foi lançada. Recolheram-se mais de cem mil, mas apenas 51 mil foram entregues no Palácio de Belém ao presidente António de Spínola, segundo a notícia que surge na primeira página de 6 de Junho de 1974.
Citando membros da comissão que recolheu as assinaturas, o jornal escreveu que "o governo entende de momento não poder resolver este grande problema que os paladinos do movimento pró-divórcio apontam como nº 2 na ordem de prioridades absolutas da nação (o primeiro é, naturalmente, o colonial)". E o DN dava conta ainda da promessa de se manifestarem no Vaticano, a favor da revisão da Concordata de 1940, entre o Estado Novo e a Santa Sé.
Com a implantação da República em 1910, o divórcio tornou-se legal em Portugal (o casamento civil vinha de 1867, durante o reinado de D. Luís). Mas Salazar negociou com o Vaticano um vasto acordo de Estado a Estado que incluía a proibição de divórcio para os casamentos católicos, o que significou décadas de famílias desfeitas e refeitas à margem da lei - e com o tal problema dos filhos ilegítimos. A interdição teve fim em 1975, com a revisão da Concordata, que permitiu de novo aos casados pela Igreja que pedissem o divórcio civil. Depois disso a lei não deixou de se ir liberalizando cada vez mais em Portugal.
Mas se o divórcio é antigo na civilização (era comum na Grécia Clássica e no Império Romano), ainda hoje não é um direito universal. Além de dificultado, para as mulheres, em muitos países muçulmanos, continua proibido nas Filipinas, o mais populoso país católico da Ásia. E só mais um Estado o interdita: o Vaticano.
Notícias Magazine
Amanhã meto-me no avião e regresso a Tóquio. As férias de Verão estão quase a acabar e voltarei a calcorrear os intermináveis caminhos do costume. É lá o meu lugar, é lá que está o meu apartamento, a minha mesa de trabalho, a minha sala de aulas, os meus alunos. Esperam-me dias tranquilos, romances por ler. Uma ou outra ligação esporádica.
Uma coisa é certa: não voltarei a ser o mesmo. A partir de amanhã, serei outra pessoa. Os que me rodeiam não se darão conta de que voltei ao Japão completamente diferente. Por fora, nada terá mudado, mas algo dentro de mim ficou reduzido a cinzas e deixou de existir. Houve sangue derramado e, dentro de mim, algo morreu. Desapareceu de vez, de cabeça baixa, sem uma palavra. Há uma porta que se abre e uma que se fecha. Apaga-se a luz. Para mim, tal como sou agora, hoje é o último dia. Este é o meu último entardecer. Quando o novo dia nascer, eu, tal como sou agora, já não estarei aqui. Outra pessoa diferente habitará o meu corpo.
Por que será que estamos condenados a ser assim tão solitários? Qual a razão de tudo isto? Há tanta, tanta gente neste mundo, todos à espera de qualquer coisa uns dos outros, e, contudo, todos irremediavelmente afastados. Porquê? Continuará a Terra a girar unicamente para alimentar a solidão dos homens?
Virei-me de costas sobre a laje de pedra, fitei o céu por cima de mim e pus-me a pensar na quantidade imensa de satélites que naquele preciso momento deviam girar à volta da Terra. No fio do horizonte era ainda possível distinguir uma réstia de luz, e as estrelas começavam a brilhar no céu de um profundo tom púrpura. Procurei com o olhar a luz de um satélite, mas havia demasiada claridade para distinguir fosse o que fosse a olho nu. As estrelas que estavam à vista permaneciam imóveis, cada uma no seu sítio, como se cravadas no céu. Fechei os olhos e prestei atenção para ver se conseguia ouvir os descendentes do Sputnik que continuavam a dar voltas à Terra, tendo como único elo de ligação ao planeta a gravidade. Solitários pedaços de metal que se encontraram de repente nas trevas do espaço, cruzam-se no seu caminho e depois separam-se para sempre. Sem trocarem uma palavra, sem fazerem uma promessa.
Haruki Murakami
* Outros BLOGUES onde estou...
* MEMÓRIAS
* RECANTOS
* BLOGUES COM "EDUCAÇÃO"
* Ecos
* Movimento dos Professores Revoltados
* Movimento Mobilização e Unidade dos Professores
* Não calarei a minha voz... até que o teclado se rompa
* Paideia:reflectir sobre Educação
* Sem Rede
* IMPRENSA
* Expresso
* Público
* Visão
* OUTROS BLOGUES
* Murcon
* SÍTIOS
* Arquivo Maria de Lourdes Pintasilgo
* G.A.I.A.
* ANTERO – ONTEM, HOJE E AM...
* POMPEIA: A vida petrifica...
* JOSÉ CARDOSO PIRES: UM ES...
* PELA VIA FRANCÍGENA, NO T...
* CHILE: O mundo dos índios...
* NUNCA MAIS LHE CHAMEM DRÁ...
* ARTUR SEMEDO: Actor, galã...
* COMO SE PÔDE DERRUBAR O I...
* CRISE TRAZ CUNHALISMO DE ...
* O CÓDIGO SECRETO DA CAPEL...
* O VOO MELANCÓLICO DO MELR...
* Explicação do "Impeachmen...
* OS PALACETES TORNAM-SE ÚT...
* Tudo o que queria era um ...
* 1974 - DIVÓRCIO JÁ! Exigi...
* Continuará a Terra a gira...
* SETEMBRO
* Por entre os pingos da ch...
* Não há vacina para a memó...
* Um pobre e precioso segre...