Não passo um dia sem te desejar, nem uma noite sem te apertar nos meus braços; não tomo uma chávena de chá sem amaldiçoar a glória e a ambição que me mantém afastado da vida da minha vida. No meio das mais sérias tarefas, enquanto percorro o campo à frente das tropas, só a minha adorada Josefina me ocupa o espírito e o coração, absorvendo-me por completo o pensamento. Se me afasto de ti com a rapidez da torrente do Ródano, é para tornar a ver-te o mais cedo possível. Se me levanto a meio da noite para trabalhar, é no intuito de abreviar a tua vinda, minha amada.
E, no entanto, na tua carta de 23, tratas-me na terceira pessoa, por senhor! Que mazinha! Como pudeste escrever-me uma carta tão fria? E depois, entre 23 e 26 medeiam quatro dias: que andaste tu a fazer, por que não escreveste a teu marido?... Ah, minha amiga, aquele tratamento de “senhor” e os quatro dias de silêncio levam-me a recordar com saudade a minha antiga indiferença. (…) Isto é pior do que todos os suplícios do Inferno. Se logo deixaste de me tratar por tu, que será então dentro de quinze dias?! Sinto uma profunda tristeza, e assusta-me verificar a que ponto está rendido o meu coração. Já me queres menos, um dia deixarás de me querer completamente, mas avisa-me, então. Saberei merecer a felicidade…
Adeus, mulher, tormento, felicidade, esperança da minha vida, que eu amo, que eu temo, que me inspira os sentimentos mais ternos e naturais, tanto como me provoca ímpetos mais vulcânicos do que o trovão. Não te peço amor eterno nem fidelidade, apenas verdade e uma franqueza sem limites. No dia em que disseres: “Quero-te menos”, será o último dia do amor. Se o meu coração atingisse a baixeza de poder continuar a amar sem ser amado, trincá-lo-ia com os dentes.
Josefina: lembra-te do que te disse algumas vezes: a natureza fez-me a alma forte e decidida. A ti, fez-te de rendas e de tule. Deixaste ou não de me querer? Perdão, amor da minha vida. A minha alma está neste momento dividida em várias direcções e combinações, e o coração, só em ti ocupado, enche-se de receios…
Enfada-me não te chamar pelo teu nome, mas espero que sejas tu a escrevê-lo.
Adeus. Ah, se me amas menos, é porque nunca me amaste. Tornar-me-ias então digno de lástima.
Napoleão
P.S. A guerra este ano está irreconhecível. Mandei distribuir carne, pão e forragens à minha cavalaria prestes a pôr-se em marcha. Os meus soldados patenteiam-me tal confiança que não tenho palavras para descrever-te. Só tu me causas desgostos. Só tu, alegria e tormento da minha vida. Um beijo aos teus filhos, de quem não me dás notícias. Ai, não! – levar-te-ia a escrever o dobro, e as visitas das dez da manhã não teriam o prazer de te ver. Mulher!!!